terça-feira, 24 de maio de 2011


Obama e Osama

 Coluna - José Miguel Wisnik 

 07.05.2011



"As duas figuras principais do livro são opostas e espelhadas: o soberano e o pária, que também podemos chamar de “banido” (Agamben é de uma erudição requintada, e descobre a figura do banido numa antiga expressão latina do direito romano, a do “homo sacer”). O poder soberano é aquele que se move dentro da lei, não como quem se submete ao seu ditame universal, mas como aquele que, ao ditála, se põe acima dela e fora dela, porque é ele que põe e dispõe, é ele que faz e desfaz a lei. O soberano é o elemento ordenador, no sentido forte de que dá as ordens supremas de vida e de morte, que faz valer a lei que não vale para ele e que, não valendo para ele, não é a lei. É a ordem e está fora da ordem. O pária é aquele que, no polo oposto, está em posição de ser morto sem punição para quem o mata, e sem direito a um rito religioso que sacralize a sua morte. Está fora da ordem jurídica e da ordem religiosa. 

O soberano e o pária não deixam de participar de uma surda lógica que lhes é co - mum, e da qual eles são os pontos extremos: ambos estão fora da lei, seja porque um pode soberanamente excluir-se dela, seja porque o outro está completamente excluído dela. A tese de Agamben, que traz em si algo daquele aspecto cabuloso das generalizações de efeito, diz que vivemos cada vez mais num estado de exceção em que o soberano é aquele para o qual todos os outros são párias, matáveis sem recurso jurídico ou religioso, e o pária é aquele, sem recurso jurídico ou religioso, para o qual todos os outros são soberanos. Num mundo em que a lei revela o seu caráter enganoso de má ficção, somos todos, no limite, párias ou soberanos. "






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